Não sou dono de uma mina de diamantes, e minhas palavras nada têm de “brilhantes”: são meros artifícios, espécie de palavras-espelhos que refletem, num mecanismo intrincado demais para se tentar explicar (em palavras), os labirintos da “mina” que sou (oh, as gírias!) de palavras espelhadas, facilmente confundíveis, quando, num jogo de luz, mostram-se com muitos lados, como um diamante já lapidado.
Lápis à mão, lápis sextavado, com meia dúzia de lados, parecendo um objeto-brilhante, rabisco...como se fosse menino-aprendiz dos primeiros traços, e tão menino que, apesar dos anos-em-série, sou capaz de acreditar, em meio ao barro constante, à terra incerta, à poeira do lugar, ao suor dessa lida subterrânea, à exaustão da procura, à frustração dos inevitáveis enganos, e até apesar da vitória pelos eventuais achados, que haja palavras-diamantes: aquelas que longamente se formam, resultado de outras (de)composições, maturando-se ao comprido das eras, e duras – duras e quase impenetráveis -, e duram...
Se eu tivesse uma mina de diamantes (de verdade) e enviasse, em datas certas, todos os anos, joias em brilhantes, preferiria receber, em troca, um(a) arte(de)fato em espelho: de saída, eu o acharia muito “polido”; depois, pensaria o quanto há nisso de “reflexão”. E mesmo desconfiado de quão caro possa ter custado, não o devolveria.
Se eu tivesse uma gíria (oh, as palavras antigas!), eu diria: joia!
Se eu tivesse uma palavra, ah, logo quereria uma mina delas – e nem mesmo tenho jeito com os espelhos, essas palavras tão delicadas que nos mostram de frente e também nos mostram de verso, ainda que não percebamos a rima.
Ah, se eu tivesse jeito com o ouro! Mesmo sem os brilhantes e não tendo deles uma mina, roubaria do sol, em início ainda de jornada, com um pedaço de espelho em sua direção, um punhado de dourados reflexos – e se dormisse no ponto (e lá se vai a hora!), esperaria o fim do dia e furtaria, do mesmo rei, um pouco do seu brilho, ainda que, agora, já metal envelhecido.
Ah, se eu tivesse no peito uma lua! Mesmo não sendo proprietário de uma mina de prata, recolheria do tronco as palavras natas – que são como prata-da-casa – e as espalharia em espelhos fragmentados como um pavimento da Via Láctea.
Ah, se ao menos eu tivesse tempo... E nem precisaria de uma mina dele! Eu repicaria os sinos e recolheria o som de bronze: sei que não é metal dos mais nobres, mas com isso eu conseguiria, pela dureza, pela durabilidade, uma palavra que não desapareceria, como o reflexo no espelho da memória de uma face já distanciada.
CHICO VIVAS