sábado, 13 de março de 2010

AVISO: ISTO É UM LIXO









Fiquemos combinados assim: o mundo é mesmo um lixo.

O lixo produz lixo, como se, reciclando-se a si mesmo, o lixo deixasse, provisoriamente, de sê-lo, ascendendo a outra coisa e, nessa sua subida, não abrindo mão do que tem como seu legítimo direito de também lixo produzir, pois, afinal, é filho de Deus (sem que eu queira, eu minha covardia ontológica, dizer que Deus é mais um lixo).

O luxo, tido por muitos, provavelmente os que fantasiam um luxo de vida, sem, no entanto, terem sequer passado perto dele, como uma inesgotável (e principal responsável) fonte de lixo, sem nem permitir que esse lixo de seu luxo se torne fonte de uma energia qualquer, porque faz parte do luxo exercer seu legítimo direito sobre aquilo pelo qual pagou, e caro, mesmo quando, perdida sua original utilidade – e a utilidade do luxo pode ser não ter mesmo qualquer função útil, sendo isso essencial para uma verdadeira vida luxuosa –, o luxo é, inequivocamente, agora, um lixo...a mais.

Foi-se o tempo – o tempo ora é um luxo a que poucos têm acesso e que produz seu próprio lixo em forma de um passado não-reciclável, ora é um evidente lixo, especialmente para aqueles que, num luxo só, vestem-se, dia e noite, com os reluzentes atavios de uma eternidade prometida – em que se podia esconder o lixo debaixo do tapete, seja pela pressa em se dar ao lixo de então seu destino mais habitual, seja porque, rigorosamente, nem lixo havia, apenas o resultado residual do hábito (para passar o tempo) de se varrer a casa, o que, quando feito por obrigação, ainda que num espaço tão exíguo que o menor dos tapetes poderia cobrir toda a área disponível, parece uma eternidade, um varrer que não quer acabar mais.

Lugar de lixo é no lixo: é o que, até há bem pouco, se dizia, com ar professoral, com intenção pedagógica, quase um slogan de vida civilizada. Agora, o luxo é não tratar o lixo como lixo, mas tratá-lo bem, tratando-o de tal maneira que ele ressurja, às vezes, literalmente, das cinzas, chegando ao requinte de se tornar, reciclado já, objeto de luxo, mesmo que o luxo da vez se restrinja a se passar por alguém preocupado com seu mundo, para além do seu próprio mundinho, como alguém que, mesmo aspirando (será que isso cheira bem?) à eternidade, tomando esse tempo no mundo como um lixo passageiro, preocupa-se com o mundo que vai deixar para trás, reconhecendo que alguns, neste mundo, podem preferir viver seu próprio tempo ansiosamente, desesperadamente, talvez por não acreditarem em nenhum outro, a ponto de vivenciarem suas horas com uma avidez que sequer lhes permite, gozadas já as horas (e nem todas elas são engraçadas), que se ponha o lixo daí resultante em continentes adequados, prontos para nova reciclagem, num refazer de mundo ad aeternum.

E dizer, tão lugar-comum como é, que não é de hoje que isso é assim, que o mundo é um lixo, é um dos poucos luxos a que tenho direito. Acho mesmo que o único. Foi por isso que, luxuoso, pus aqui todo este lixo.




Glitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word GeneratorGlitter Word Generator


Nenhum comentário:

Postar um comentário


Share/Save/Bookmark

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails