Tem-se a impressão, especialmente a têm os mais observadores, de que a publicidade, espécie de reluzente estandarte, sempre tremulando, do capitalismo, assim como este mesmo, não é dada a emotividades, embora, recorrentemente, faça uso disso, preferindo, no entanto, o pragmatismo: e é justamente em nome dele que se se faz passar até por um emotivo irrecuperável, se necessário for para se ganhar (ou se recuperar) mercado.
A propaganda dos curativos, desses autoadesivos, autocolantes, às vezes, ao custo de uns fios de cabelos arrancados, dirige-se, preferencialmente, ao público infantil, talvez na crença, algo infantil, ainda que baseada em confiáveis pesquisas, de que só as crianças precisam de um sopro sobre suas feridas – aí, na forma de um curativo virtual. Já não (tão) crianças, crê-se, sabemos nós, que um dia fomos uma delas, como lidar com os nossos machucados, sabendo que os sopros não aliviam a dor, podendo até mesmo, circunstancialmente, ao contrário, aumentá-la, além de que, se precisamos de um curativo, sabemos onde ir buscar o band aid.
Assim é que a publicidade, tentando desviar a atenção dos pequenos, concentrada, egoístas como são, por natureza ainda em formação, em sua própria dor, como se nada mais houvesse no mundo, nada que valha sua atenção, oferece ao mercado curativos decorados, coloridos, quase falantes, como se a cor, os desenhos tivessem algum poder anestésico, e a voz virtual lhes dissesse, como num caricioso sussurro maternal: pronto, o dodói já passou!
Assim é que se deixa de lado a necessidade de quem já cresceu, como se as feridas estivessem, para nós, na proporção inversa da nossa idade: pequenos, muitas delas, por não se saber ainda como se defender dos ataques naturais; crescidos, supondo que nos tornamos guerreiros invulneráveis, eis que as feridas diminuiriam. Talvez por isso percamos, com o passar do tempo, a capacidade de lidar com nossos ferimentos, a ponto de, quando um deles nos vem, sabermos onde está o band aid, mas, apesar do desejo, não sabermos mais como pedir a alguém que sopre nosso...dodói - e, quem sabe, essa ferida só precise mesmo de um sopro...de esperança.
Não conheço bem a indústria dos curativos, mas sei que são fabricados em tamanhos diversos, para situações variadas, havendo crianças que, pelos desenhos, pelas cores quase choram (como se estivessem sofrendo um ataque) por um band aid maior do que a necessidade de se cobrir um mero arranhão, quase invisível a olho nu; havendo, no entanto, os "crescidos" que, precisando de um curativo de grandes proporções, teimam, para não exibirem o tamanho de seus sofreres, em usar um mínimo band aid, incapaz de velar a ferida, revelando, contrariando um desejo pessoal, além dela, esse seu desejo de não dar a conhecer suas dores.
Obrigado pelo curativo! Ficará guardado, sempre à mão, para uma emergência. Porque a dor mais imediata ele já curou, sem que eu tenha precisado usá-lo: recebê-lo, por si só, já foi como um sopro num dos meus dodóis.
CHICO VIVAS
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